quarta-feira, julho 25, 2007

Perder a Inocência - Capítulo I - Os Medos de Jaime


A noite já tinha chegado e nem tinha dado conta. Vinha encurtando, o mais rápido que podia, o caminho da vila até casa. Há muito que devia estar em casa com o banho tomado à espera que a minha mãe me chamasse para jantar. O meu pai não gostava que nos atrasássemos para o jantar. Aquela hora era sagrada, a hora que a família se reunia com o único pretexto, de estar junta a realizar a refeição do dia onde podíamos e devíamos estar todos presentes.
Não havia como fugir ao sermão, mas não era a repreensão do meu pai que mais me preocupava. Preocupava-me mais se ele visse algo em mim, que descobrisse que mudei, que já não era o mesmo e me obrigasse a confessar o que estava escrito na minha cara.
Tinha saído, como nos outros dias normais, para ir brincar para a vila com os meus amigos. No Monte da Oliveira, o nosso monte, onde temos a nossa modesta casinha, não há mais nenhuma criança para além do chato do meu irmão Zeca que é mais novo e também prefere as brincadeiras da vila com todas as crianças que andam por lá. Para além de jogarmos à bola, ao pião, à malha, à apanhada ou às escondidas, quando faz calor, como fez hoje, vamos todos nadar para a ribeira. E foi nos banhos da ribeira que tudo começou.
Normalmente, enquanto esperávamos pelo tempo da digestão do almoço, por baixo da sombra de uma azinheira, vamos atirando pedras à ribeira e falando os assuntos que nos preocupam e interessam a todos. Falamos das travessuras e dos castigos, dos truques para a pesca e para a caça, das novidades do futebol, das notícias da vila e das experiências inocentes vividas com as raparigas ou com as mulheres vizinhas. É nessa altura que comparamos a nossa virilidade, em todos os aspectos, e sentimo-nos já homens capazes de tudo.
Chegada a hora, tirámos toda a roupa e saltámos para a água. E assim nus, nadámos e brincámos uns com os outros, sem nos preocuparmos com as lavadeiras que olhavam curiosas e comentavam bem alto as suas opiniões sobre aqueles que lhes causavam espanto.
Comentaram que o Miguel do Chico da Mercearia já pinta, que o Filipe da Ti Mari’ Júlia, apesar de ser o mais novo e o mais pequeno, tem a picha maior e também falaram de mim, porque, apesar da minha idade, de todos sou o que está mais desenvolvido. Até a Manela que trabalha prós Tavares disse: “ Naaa!!! Olhem pró Jaime da Ti Mari’ de Jesus, tá um verdadeiro rapagão, aquilo é que é um homem!” E todos gozam com o meu embaraço.
Continua.

Sem comentários: